"Vendo as multidões, Jesus subiu ao monte e se assentou. Seus discípulos aproximaram-se dele, e ele começou a ensiná-los, dizendo: Bem-aventurados os pobres em espírito, pois deles é o Reino dos céus.” Mateus 5.1-3.
Alcançar a felicidade é a maior ambição do ser humano desde sempre. Todos desejam ser feliz. O dicionário Aurélio define felicidade como “Bom êxito; Sucesso”. Em outras palavras, a felicidade corresponde a um estado contínuo de satisfação plena. É uma sensação de prazer resultado de realização total, portanto, emocional, financeira, social, espiritual, e etc. Essa é a maior riqueza que qualquer pessoa pode ter. Na Bíblia, a palavra à qual o termo “felicidade” traduz é ashréi, do hebraico, ou makarioi, do grego. A expressão em hebraico pode ser entendida como marchar rumo a Iahveh. A expressão em grego é mais hedonista, embora também, inacessível ao homem, pois é geralmente usada para representar a felicidade dos deuses. O que nos permite pontuar que ser feliz, biblicamente falando, é estar inserido na felicidade do próprio Deus; é caminhar em direção ao Reino de Deus, ou dele ser parte. Em Uma Ortodoxia Generosa, Brian McLaren define o reino de Deus como “o sonho de Deus, o desejo, o anseio e a esperança de Deus para a criação – como as esperanças e sonhos dos pais para seu filho amado.” Portanto, considerando o ensinamento de Jesus vemos que Deus quer que nós sejamos felizes. Mas a felicidade não é fruto da conquista de coisas, de pessoas, de relacionamentos, ou status social ou econômico, e etc. A felicidade diz respeito ao modo como escolhemos viver o nosso dia-a-dia. Ao tipo de relacionamento que decidimos ter com nossos cônjuges, irmãos e irmãs, colegas de trabalho, com o nosso próximo de modo geral. Na verdade, para sermos felizes precisamos participar da felicidade de Deus. Precisamos comungar com os seus sonhos e ideais. Precisamos ser súditos legítimos do seu reino. Ser feliz é viver conforme a imagem de Deus, porque fomos criados à sua imagem, segundo sua semelhança. E como escreveu Ed René Kivitz em Outra Espiritualidade, “A vida de acordo com a imagem de Deus, entretanto, não é um lugar aonde se chega, mas sim o jeito como se vai. Mais importa a caminhada do que o ponto de chegada.” Jesus ressaltou no texto acima, que viver conforme a imagem de Deus é ser pobre em espírito, posto que a estes é que pertence o reino de Deus.
Neste ponto temos que atrelar uma realidade à outra. Felizes são os pobres em espírito. Certo dia, numa discussão sobre quem seria o maior dentre os que seguiam Jesus, o Senhor falou: “Portanto, quem se faz humilde como esta criança, este é o maior no Reino dos céus. Mt 18.4”. Algumas linhas depois, aqui em Mateus, achamos uma afirmação ainda mais contundente: “Deixem vir a mim as crianças e não as impeçam; pois o Reino dos céus pertence aos que são semelhantes a elas. Mt 19.14”. Ou seja, o pobre em espírito é aquele que se faz humilde como uma criança. Mas pra ficar um pouco mais claro, esta mesma discussão segundo o relato de Lucas nos brinda com uma sentença incrivelmente esclarecedora: “Pois aquele que entre vocês for o menor, este será o maior. Lc 9.48”. Quando Paulo escrevia sua primeira carta aos coríntios sobre seu chamado ele disse: “Pois sou o menor dos apóstolos e nem sequer mereço ser chamado apóstolo, porque persegui a igreja de Deus. 1Co 15.9”. A despeito de toda sua importância para a Igreja dos seus dias, que Paulo sabia que tinha, ele se fazia o menor dentre os que serviam porque tinha uma clara visão sobre si mesmo. Em Romanos 7.24-25 ele exclamou: “Miserável homem que eu sou! Quem me libertará do corpo sujeito a esta morte? Graças a Deus por Jesus Cristo, nosso Senhor!” Paulo sabia que sua autoridade para ser servo do reino de Deus entre os seus próximos vinha exatamente de seu alto-conhecimento. Vinha do fato de se reconhecer como um miserável pecador, por mais devotado e desejoso em obedecer que fosse. O apóstolo Paulo sabia que a sua esperança e redenção estavam apenas na misericordiosa graça de Deus, revelada naquele nos ensinou, ele mesmo, a perdoarmos ao nosso próximo tantas vezes quantas nós gostaríamos de ser perdoados. A perdoar sempre. 70 x 7. Porque isso é amar o próximo como a nós mesmos. Apenas uma conversa sincera com o espelho nos aponta o caminho em direção ao nosso próximo. Apenas essa conversa honesta com nós mesmos pode nos conduzir a um estado de alto-humilhação que nos permite amar com o cuidado e com a paciência com que Deus ama. E apesar de não se poder amar sem dor, sem muita dor, o caminho das pedras para a felicidade nossa de cada dia é esse. Porque felizes são os que tem a humildade de serem honestos consigo mesmos, ao ponto de se identificarem com a fraqueza do outro em misericórdia, pois destes é o Reino dos céus.