Rm 5.15-21.
A Bíblia nos ensina que o homem foi feito a imagem e semelhança de Deus (Gn 1.26). Essa verdade resolve a nossa questão quanto ao sentido da vida. Ou seja, nós fomos feitos para expressarmos a Deus enquanto somos um com ele, assim como foi Jesus Cristo homem (“para que todos sejam um, Pai, como tu estás em mim e eu em ti. Que eles também estejam em nós, para que o mundo creia que tu me enviaste. Dei-lhes a glória que me deste, para que eles sejam um, assim como nós somos um: eu neles e tu em mim. Que eles sejam levados à plena unidade, para que o mundo saiba que tu me enviaste, e os amaste como igualmente me amaste.” Jo 17.21-23). Jesus foi o humano mais humano que existiu. Ele foi a concretização do sonho de Deus a respeito da humanidade. Depois da transgressão, ele foi o primeiro de muitos. O primeiro do novo processo de criação de todas as coisas (2Co 5.17). O inverso disso é a demonização do “eu” à exemplo do ocorrido com Satanás e seus anjos.
Quando os setenta discípulos de Lucas 10 voltaram exultantes pelo fato de os espíritos imundos se lhes submeterem, Jesus os advertiu de que se alegrassem é pelo fato de terem seus nomes escritos nos céus, pois ele mesmo havia visto “Satanás caindo do céu como relâmpago” (v. 18). Essa expressão de Jesus pode ser uma referência ao texto do profeta Isaías, comumente entendido como referente à Satanás e seu pecado (“Como você caiu dos céus, ó estrela da manhã, filho da alvorada! Como foi atirado à terra, você, que derrubava as nações! Você que dizia no seu coração: “Subirei aos céus; erguerei o meu trono acima das estrelas de Deus; eu me assentarei no monte da assembléia, no ponto mais elevado do monte santo. Subirei mais alto que as mais altas nuvens; serei como o Altíssimo”.” Is 14.12-14). O texto mostra que o Diabo se ensoberbeceu e desejou a glória do Altíssimo, de modo a fazer-se semelhante a Ele. Essa semelhança, porém, não era como a concedida aos filhos de Adão, como C. S. Lewis gosta de chamar, mas era uma semelhança que fazia atrair para si mesmo o mérito por todas as coisas, e o governo de tudo. Aqui, nós encontramos duas propostas diferentes, e por que não, opostas, em relação a ser semelhante a Deus.
Contrária à vontade de Deus, a proposta de Satanás, e que foi acolhida por seus anjos (Mt 25.41), é de demonização do ser, uma vez que o modelo proposto é o da glorificação do “eu”. Se pensarmos nas obras da carne listadas por Paulo, as quais são: “imoralidade sexual, impureza e libertinagem; idolatria e feitiçaria; ódio, discórdia, ciúmes, ira, egoísmo, dissensões, facções e inveja; embriaguez, orgias e coisas semelhantes” (Gl 5.19-21), poderemos então perceber que todas elas apontam para uma única direção: a alimentação do “eu” pelo prazer egoísta, que gera a ilusão de que tudo o que importa sou eu, ou a minha satisfação pessoal. Na proposta de Deus nós aprendemos a viver em comunidade (Mt 6.9-13), visto que Deus é uma comunidade de iguais (Gn 1.26; Jo 1.1-3,14; Lc 3.21-22); aprendemos a nos doar (Jo 3.16; Mt 20.28; “Seja a atitude de vocês a mesma de Cristo Jesus, que, embora sendo Deus, não considerou que o ser igual a Deus era algo a que devia apegar-se; mas esvaziou-se a si mesmo, vindo a ser servo, tornando-se semelhante aos homens. E, sendo encontrado em forma humana, humilhou-se a si mesmo e foi obediente até a morte, e morte de cruz!” Fl 2.5-8); e nesse processo, aprendemos que ser imagem e semelhança de Deus é ser humano conforme o exemplo de Jesus de Nazaré. E ser humano à moda do Cristo de Deus é esvaziar-se. É ter o outro por maior estima do que a sim mesmo. É se permitir viver numa comunidade de amor formada por Deus, por mim e pelo outro. É amar com a consciência de que fomos imerecidamente amados primeiro. E que, “Se alguém afirmar: “Eu amo a Deus”, mas odiar seu irmão, é mentiroso, pois quem não ama seu irmão, a quem vê, não pode amar a Deus, a quem não vê” (1Jo 4.20).
A questão, portanto, é no que queremos nos tornar enquanto caminhamos, homens e mulheres humanizados, ou demonizados. Aos que tem sede por sentido na vida, e desejam encontrá-lo em Deus, fica a recomendação do apóstolo Paulo aos filipenses: “Seja a atitude de vocês a mesma de Cristo Jesus” (Fl 2.5).