quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

A Graça de Sermos Cooperadores

“Quando Jesus saiu de barco e viu tão grande multidão, teve compaixão deles e curou os seus doentes. Ao cair da tarde, os discípulos aproximaram-se dele e disseram: “Este é um lugar deserto, e já está ficando tarde. Manda embora a multidão para que possam ir aos povoados comprar comida”. Respondeu Jesus: “Eles não precisam ir. Dêem-lhes vocês algo para comer”. Eles lhe disseram: “Tudo o que temos aqui são cinco pães e dois peixes”. “Tragam-nos aqui para mim”, disse ele. E ordenou que a multidão se assentasse na grama. Tomando os cincos pães e os dois peixes e, olhando para o céu, deu graças e partiu os pães. Em seguida, deu-os aos discípulos, e estes à multidão. Todos comeram e ficaram satisfeitos, e os discípulos recolheram doze cestos cheios de pedaços que sobraram. Os que comeram foram cerca de cinco mil homens, sem contar mulheres e crianças.” Mt 14.14-21

A riqueza desse episódio dos evangelhos é, creio eu, impossível de mensurar. Portanto, o que se pode aprender aqui, jamais se pode esgotar numa meditação. Mas assim como a uma fonte perene não nos dirigimos senão na expectativa de uma determinada porção de água, assim nos debruçamos por aqui mais uma vez. 

A primeira coisa que me chama a atenção neste texto me remete ao capítulo anterior, quando Jesus explicava aos seus discípulos a razão de falar às multidões que o seguiam, apenas por meio de parábolas. “Ele [Jesus] respondeu: “A vocês foi dado o conhecimento dos mistérios do Reino dos céus, mas a eles não” (v. 11).” Por alguma razão – a qual eu penso que só o Senhor mesmo pode conhecer – a alguns “é dado a conhecer dos mistérios do Reino dos céus”, ou seja, é concedida, por meio de graça, revelação do Senhor, mas de outros essa revelação é retida. E esse era o caso da multidão que testemunhou esse incrível episódio da primeira multiplicação dos pães. A maior prova disso está na narrativa feita por João, que deixa claro que mesmo depois de ter visto o sinal miraculoso de Jesus, o povo só conseguiu relacioná-lo a um grande profeta, mais do tipo de Moisés, e menos do tipo do Messias esperado. Para ficar ainda mais claro, João salienta a intenção do povo de fazê-lo rei à força, o que demonstra total confusão, no que se refere à compreensão da mensagem pregada por Jesus, e da sua nova proposta de vida – “Depois de ver o sinal miraculoso que Jesus tinha realizado, o povo começou a dizer: “Sem dúvida este é o Profeta que devia vir ao mundo”. Sabendo Jesus que pretendiam proclamá-lo rei à força, retirou-se novamente sozinho para o monte.” Jo 6.14-15. Bem, este fato, no entanto, o da ‘não revelação’, não impediu que Jesus tivesse compaixão por aquelas pessoas, de modo a curar seus doentes e a não deixá-los partir com fome. Isso me faz lembrar o quanto somos, na maioria das vezes, equivocadamente seletivos quanto a quem “ajudamos” ou continuamos a ajudar. Nós nos viciamos em resultados. Servir por misericórdia não basta. Se o “indivíduo” não se converter ao nosso grupo ou visão em dois tempos, “corta-lhe a cesta básica”! A mensagem de não permitir que a mão esquerda veja o que a direita fez, ou a de dar sem esperar nada em troca, ou sem olhar a quem, a gente teima em não levar tanto em conta, como se esses ensinamentos tivessem importância secundária. 

Outro aprendizado que ganho netse momento, está também atrelado à narrativa de João. Jesus pergunta a Filipe sobre algum lugar onde poderiam comprar pão para o povo comer, e então João comenta: “Fez essa pergunta apenas para pô-lo à prova, pois já tinha em mente o que ia fazer.” Jo 6.6. Além de notarmos a intenção de ensinar os discípulos a terem iniciativa de chamarem a responsabilidade para si, de serem proativos, mesmo, diante das circunstâncias relacionadas a eles mesmos e especialmente a outros, no intuito de ajudar (“Onde compraremos pão para esse povo comer?” Jo 6.5b), também podemos ver que Jesus estava bem à frente dos discípulos, também no que se refere ao plano a ser posto em prática naquela ocasião. Isso me leva a compreensão de que nem sempre nos damos conta de que o Senhor está sempre à nossa frente. Frequentemente nós nos colocamos a orar por alguns projetos, ou algumas situações, com a postura de quem quer dizer a Deus o que fazer, ou como as coisas devem acontecer. Na verdade, nós não entendemos que Deus está trabalhando, sempre antes de nós! Esse texto, na realidade, nos trás um rico ensinamento sobre o nosso papel como servos de Deus. Ele nos lembra que nossa posição não é outra, senão a de cooperadores de Deus na sua obra. Deus é soberano. E os seus planos são sobremaneira mais excelentes que os nossos. Ele não está ocioso e sisudo em seu trono branco esperando ser convencido por nós a fazer algo de bom por aqui! Ele está em movimento, e sempre à nossa frente. E a nossa postura de oração e prática de vida deve ser sempre a de buscar dele mesmo, a compreensão do que ele está fazendo, e do que nós devemos fazer para não perdermos o privilégio de sermos seus cooperadores. Deus tem os seus planos. E ele vai executá-los, com ou sem a nossa ajuda, porque ele é o soberano Senhor. Mas ele espera de nós que cooperemos com ele. Por isso a nossa postura deve ser sempre a de quem deseja descobrir dele, por meia da comunhão, da oração, como nós podemos cooperar com ele, em sua obra na vida de nossa família, de nossa comunidade de fé, na vida da minha esposa, do meu esposo, de meu filho, de meus pais, de meu amigo, visinho, colega, e etc.

Ser cooperador do Senhor em suas ações é um privilégio, mas que exige como requisito a disposição de viver segundo o coração de Deus, e ter a mente de Cristo. A comunhão com o Senhor é o caminho. E essa comunhão se configura pela relação cheia de misericórdia e desprovida de preconceito com o nosso próximo, ainda que este não seja tão próximo assim; pela leitura e meditação da palavra de Deus; e pela oração que se faz numa conversa, onde além de falar, também ouvimos o Senhor, movendo-nos em direção ao seu próprio coração, de modo que, submissos e cheios de gratidão, nos juntamos a ele em seu constante movimento de sabedoria e graça.

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